Páginas

sexta-feira, 18 de março de 2011

Fatos e Falácias de Engenharia de Software - Estimativas de projetos de software

Dando continuidade a seqüencia de postagens sobre temas polêmicos em engenharia de software, o tema da discussão dessa postagem será: Estimativas de projetos de software.

É impressionante como essa parte fundamental do processo de desenvolvimento de software ainda hoje seja realizada de maneira tão errônea e que sofra com influências tão negativas quanto às discutidas nesse resumo.

Caso alguém já tenha sentido na pele algum desses fatores negativos e queira compartilhar essa experiência ruim para enriquecer nossa discussão, não deixe de comentar.

Universidade Federal de Viçosa
Departamento de Informática
Mestrado em Ciência da Computação
INF 622 - Engenharia de Software
Resumo nº 2


Fatos Estudados
09 - A maioria das estimativas de software são realizadas no início do ciclo de vida. Isso faz sentido, até que percebemos que as estimativas são obtidas antes dos requisitos serem definidos e, portanto, antes do problema ser compreendido. Estimativa, portanto, ocorre geralmente na hora errada.
10 - A maioria das estimativas de software são feitas tanto pela alta gerência ou pelo marketing, não pelos profissionais que irão construir o software ou os seus gestores. Estimativa é, portanto, feita por pessoas erradas.
11 - Estimativas de software raramente são ajustadas conforme o andamento do projeto. Assim sendo, as estimativas feitas no momento errado, por pessoas erradas, geralmente não são corrigidas.

Discussão
Os fatos estudados analisam alguns problemas relacionados às estimativas de projetos de software. O nono fato trata do momento do processo de software em que as estimativas são traçadas. Ele apresenta um problema que pode soar absurdo nos dias de hoje, mas que na prática acontece em alguns projetos. Algumas equipes traçam as estimativas de tempo e custos de um projeto de software previamente ao levantamento de requisitos, algo que é completamente inaceitável, se considerarmos as melhores práticas de gestão de projetos de software. Após o levantamento e análise dos requisitos é que o problema a ser resolvido pelo projeto começa a ser realmente entendido, portanto, fazer estimativas antes na análise de requisitos é como dar um tiro no escuro, pois dificilmente a equipe terá argumentos sólidos onde se basear neste ponto de partida do ciclo de vida.

Segundo MARÇAL [2], em projetos gerenciados por Scrum, o cronograma é extraído do Product Backlog, sendo que as estimativas são feitas em dois níveis. Primeiro em alto nível, analisando cada requisito do Product Backlog para assim obter-se uma visibilidade geral do projeto e durante o processo são feitas estimativas de cada Sprint Backlog, oferecendo dessa forma uma visibilidade mais precisa de cada iteração.

O décimo fato é diretamente relacionado ao nono. Muitas das vezes as estimativas são traçadas no momento errado porque as pessoas responsáveis por elas também eram inapropriadas para tal. A alta gerência e/ou os responsáveis pelo marketing, na maioria das vezes não tem uma visão bem definida ou entendimento suficiente sobre qual é a importância dos requisitos e muito menos em como a alteração deles pode impactar sobre as estimativas do projeto todo. Sendo assim, ao invés dos profissionais de software (analistas, programadores, etc) serem os encarregados por traçarem as estimativas, baseando-se nos requisitos, dados históricos e outros fatores relevantes, quem acaba traçando as estimativas ao cliente são a alta gerencia e o marketing, pessoas geralmente desqualificadas para realizar tal tarefa. Por esse motivo essas pessoas acabam fazendo-a de forma errônea, geralmente considerando muito mais o desejo em detrimento ao que seria realmente possível.

Embora possa parecer absurdo que softwares profissionais sejam concebidos a partir de estimativas errôneas realizadas por pessoas inadequadas, os autores do estudo de CASE [1] mostram que impressionantes 70% dos softwares são concebidos dessa forma, com estimativas sendo definidas pelos usuários (clientes) e apenas 4% das estimativas são realizadas pela equipe do projeto.

O fato 11 relaciona-se aos dois anteriores, acrescentando ainda mais acontecimentos que fogem ao padrão. Considerando que as estimativas são geralmente traçadas no momento errado e por pessoas inapropriadas, o resultado final só poderia ser um projeto mal estimado e que não atende à realidade, porém, por incrível que pareça, a alta gerência além de traçar suas estimativas erroneamente, ignorando fatores como a complexidade do projeto e o custo real para atender aos requisitos, dificilmente ela permite mudanças de cronograma, obrigando assim a equipe de desenvolvimento a trabalhar o quanto for necessário para atender aos seus desejos.

Controvérsia
Dificilmente alguém conseguirá apresentar uma controvérsia ao nono fato, haja vista que antes de detalhar o que será desenvolvido, o risco de traçar uma estimativa errada é muito alto e pode ser determinante para um projeto fracassar. Mesmo em equipes que já possuem ampla experiência em diversos tipos de projetos, traçar uma estimativa analisando superficialmente um problema e comparando-o a outros projetos “semelhantes” já realizados pela equipe é algo perigoso, pois mesmo que exista muitos pontos em comum entre eles, os pequenos pontos que divergem podem impactar em vários outros, gerando assim um “efeito dominó” que impossibilita a precisão dessa estimativa por comparação superficial de semelhanças.

Controvérsias para o décimo fato também são difíceis de serem citadas, pois é claro que para traçar estimativas de software, precisa-se ter conhecimento de causa e basear-se e referências concretas a fim de dar uma visibilidade mais precisa do projeto, e somente as pessoas ligadas diretamente a ele (programadores, analistas, etc) tem essa capacidade. Tanto a alta gerência quanto o marketing, geralmente só são capazes de traçar estimativas baseadas nos negócios, nos desejos comerciais e não no processo em si.

Geralmente as estimativas traçadas pela alta gerência são motivos de discórdia entre os membros da equipe de desenvolvimento, porém quando a equipe é questionada pela alta gerência sobre o que daria pra ser feito no tempo estimado, freqüentemente essa resposta não é dada com precisão pela equipe, o que acaba gerando desconfiança na alta gerência sobre a capacidade da equipe traçar estimativas, entretanto isso é um erro. Possivelmente as equipes têm dificuldade em dar precisão para a alta gerencia sobre o que seria capaz de fazer em determinado tempo devido a esse questionamento ser feito em momento inoportuno, como por exemplo, antes do conhecimento detalhado dos requisitos.

A controvérsia ao fato 11 chega a ser injusta. As estimativas traçadas no momento errado e por pessoas erradas tendem a gerar cronogramas impossíveis de serem cumpridos a risca, pois como eles são feitos considerando geralmente apenas o desejo da gerencia e não a complexidade real do problema a ser resolvido e os prazos previstos, na maioria das vezes acabam não sendo cumpridos e custos adicionais podem ser gerados por esse descumprimento. A culpa principal desses acontecimentos é dos responsáveis pelo estabelecimento das estimativas (alta gerência ou marketing), porém quem realmente leva a culpa é a equipe, que na verdade é a maior vítima de toda a situação.

Analisando os fatos apresentados de forma ampla, percebe-se que existem poucas controvérsias a respeito deles, isso é ocasionado devido ao consenso geral no qual eles estão inseridos. Todos os profissionais de software sabem na realidade quem deve fazer as estimativas dos projetos, o que deve ser levado em consideração para tal, quando as estimativas devem ser traçadas e no caso de falhas ao estimar, medidas corretivas devem ser tomadas no cronograma e informadas aos stakeholders. Infelizmente na prática essas questões não são respeitadas devido a políticas empresariais internas pouco evoluídas.

Referências bibliográficas
[1] CASE. "CASE/CASM Industry Survey Report." HCS, Inc., P.O. Box 40770, Portland, OR 97240. 1991.

[2] MARÇAL, Ana Sofia; FREITAS, Bruno Celso C.; FURTADO, Felipe; MACIEL, Teresa; BELCHIOR, Arnaldo Dias. Estendendo o SCRUM segundo as áreas de processo de gerenciamento de projetos do CMMI. 2007 Disponível em: http://www.cesar.org.br/files/file/SCRUMxCMMI-CLEI-2007.pdf. Acesso em 27 mar. 2010.

Nenhum comentário: